Pipa perdida
O metrô está atrasado. Imitando as pessoas ao meu redor, saco o celular do bolso a cada minuto, como se isso
apressasse o tempo. Mesmo dentro da estação faz frio e o meu sobretudo afasta o que o terno não consegue.
Os indivíduos que me cercam, encolhidos em cachecóis e jaquetas, contrastam com o menino que corre em minha
direção. Todos os dias ele aparece, vestindo sua habitual camiseta de super-heróis e uma bermuda lilás. Nas mãos
leva a pipa azul que carrega constantemente. Seus cabelos compridos esvoaçam, como se houvesse uma brisa
carregando-os, uma brisa que me lembra o verão na praia. Ninguém pôde vê-lo e eu tento ignorá-lo, porém, como
de costume, não adianta. Ele ergue a pipa e diz:
apressasse o tempo. Mesmo dentro da estação faz frio e o meu sobretudo afasta o que o terno não consegue.
Os indivíduos que me cercam, encolhidos em cachecóis e jaquetas, contrastam com o menino que corre em minha
direção. Todos os dias ele aparece, vestindo sua habitual camiseta de super-heróis e uma bermuda lilás. Nas mãos
leva a pipa azul que carrega constantemente. Seus cabelos compridos esvoaçam, como se houvesse uma brisa
carregando-os, uma brisa que me lembra o verão na praia. Ninguém pôde vê-lo e eu tento ignorá-lo, porém, como
de costume, não adianta. Ele ergue a pipa e diz:
– Que tal hoje? Hoje depois do seu trabalho?
Tento não mirá-lo, contudo ele puxa a alça da minha bolsa e sou obrigado a fitá-lo e dizer:
– Já disse que não…
– Ah! Isso foi ontem!
– A resposta continua a mesma.
Ele abaixa a pipa e me encara. Desta vez os pequenos olhos brilham, marejados de lágrimas. Olho para o túnel
escuro, e nem sinal do metrô. O pequeno repete a pergunta de sempre:
escuro, e nem sinal do metrô. O pequeno repete a pergunta de sempre:
– Por que não?
– Não tenho tempo.
– O que é o tempo?
Desta vez fui pego de surpresa. Ele geralmente ia embora depois da minha escusa, e eu não voltava a pensar nele
até o outro dia, na espera do trem. Ele permaneceu, fixando meus olhos como se eu fosse sumir se ele não o
fizesse. Respondo:
até o outro dia, na espera do trem. Ele permaneceu, fixando meus olhos como se eu fosse sumir se ele não o
fizesse. Respondo:
– É o período no qual as coisas acontecem.
– Se você não tem tempo, como tem o período no qual as coisas acontecem?
Abri a boca para responder e tornei a fechá-la, antes de realmente ter o que dizer. Passados alguns segundos,
explico:
explico:
– Eu quis dizer que sou muito ocupado… tenho trabalhos de faculdade para fazer após chegar em casa.
– E quando se diverte?
Eu ri, mas sem achar graça. Novamente, olho para a escuridão do túnel, depois para as horas no celular. A criança,
ainda me encarando, diz:
ainda me encarando, diz:
– De que adianta rir, se não está feliz?
– Eu sou feliz! – exclamo, agora olhando o rosto do rapaz, já sem conseguir sorrir.
– Você dizia que queria ser bombeiro, lembra? Ajudar pessoas…
– Tínhamos nove anos. As coisas mudam, contas a pagar.
– E para isso precisou se sujeitar a um trabalho que não te alegra e conquistar um diploma que dizem ser o melhor,
exceto você. Comprar coisas que não enchem seu coração, apenas seu ego diante de outros.
exceto você. Comprar coisas que não enchem seu coração, apenas seu ego diante de outros.
Podia ouvir os trilhos assobiarem entre as conversas das pessoas nos celulares, alheias a nós. Observo o túnel,
não suportando a expressão do menino, que fala:
não suportando a expressão do menino, que fala:
– Sempre vou estar com você, para lembrá-lo quem é, o que te faz feliz.
Queria largar a minha bolsa e segui-lo, empinar a pipa até ela ser escondida pelas nuvens. Então os passageiros
desembarcam do trem recém chagado. Entrando nele, seguro numas das barras e olho pela janela… meu menino
tinha desaparecido quando lembrei: reunião às 10h00.
desembarcam do trem recém chagado. Entrando nele, seguro numas das barras e olho pela janela… meu menino
tinha desaparecido quando lembrei: reunião às 10h00.
Comentários
Postar um comentário